Luis Carvalho*
O ano eleitoral para o pleito municipal se inicia e com ele a corrida nas diversas cidades do país. Embora muitas pessoas não considerem as eleições municipais como tendo muita importância elas são a principal forma de aferir os caminhos políticos brasileiros. Muito por conta do histórico e legado que o Brasil possui.
Uma das primeiras formas de administração do Brasil colônia foram as chamadas câmaras municipais. Elas se constituíam na forma de administrar as capitanias e fortalecer as pequenas localidades, posteriormente transformadas em cidades. Dessa estrutura emergiam os principais nomes e debates em torno dos temas que envolviam anseios nacionais.
Há um abismo histórico do período colonial até os dias atuais, mas a importância das Câmaras Municipais continua, uma vez que elas são o elo mais “próximo” do povo com a política. Sendo assim, impõem-se à esquerda a missão de encurtar esse espaço, envolver no debate e eleger representantes ao legislativo municipal.
Na contramão do modelo adotado em grande parte do país em que o político é eleito e não dá nenhuma satisfação do mandato a esquerda necessita atuar junto aos coletivos e aproximar-se dos anseios populares de maneira a fazer do mandato uma verdadeira representação dos interesses do povo.
Por vezes e de forma equivocada concebeu-se o poder somente sob o prisma econômico e político sem levar em consideração as demais implicações do mesmo. O amadurecimento após algumas experiências fracassadas e, sobretudo, com a ascensão de candidatos outsiders (banalizando a política e achincalhando instituições) a concepção deve ser entendida num sentido mais consubstancial e teórico conforme podemos observar na definição de Sader: “O poder é uma relação social, da mesma forma que o capital. A alteração de sua natureza, a construção das bases de um novo poder é, portanto, um processo político, entendido este como síntese das relações econômicas e sociais, institucionais e militares” (SADER, 2003, p.21)
Nesse sentido, o poder ou a forma como esse é exercido deve ser stricto senso representativa, ou seja, necessita levar em consideração as verdadeiras demandas populares. Já dizia o filósofo argentino Enrique Dussel que o poder deve ser obediencial, isto é, obedecer mais do que dominar. A dinâmica de uma esquerda popular deve ser de atuar em obediência às demandas. Por isso deve estar em consonância com os desejos populares.
De mesma sorte há de se pensar em mecanismos que visem romper com alguns problemas estruturais e deixam as populações periféricas em situação de vulnerabilidade por isso, a iniciativa de uma vereança de esquerda deve se configurar como crítica e radical. Aqui tomamos emprestado o conceito de Vazquéz quando afirma:
Para que a crítica vingue, tem que ser radical. “Ser radical – diz Marx é atacar o problema pela raiz. E a raiz para o homem é o próprio homem”. Crítica radical é crítica que tem o homem como centro, como raiz, o homem; crítica que responde a uma necessidade radical. “Em um povo, a teoria só se realiza à medida em que é a realização de suas necessidades” (VÁZQUEZ, 2007, p.117).
Nesse sentido, as demandas da classe trabalhadora, isto é, das pessoas que produzem a riqueza da sociedade e são privadas das benesses desse lucro precisam ser contempladas, minimamente e de forma digna. Por isso iniciativas populares devem levar em conta essa crítica tanto quanto sua radicalidade em enfrentar os problemas de frente.
Algumas alternativas têm surgido com o intuito de organizar de forma coletiva tanto a sociedade, quanto o poder nela exercido. Lembramos que somente com uma boa base teórica se pode conseguir êxito. Uma das formas utilizada ultimamente são os mandatos coletivos no poder legislativo, que tendem a se aproximar das propostas coletivas implementadas em alguns países de inspiração socialista.
Contudo, como estamos num sistema democrático complexo que guarda em seu seio algumas instituições conservadoras a dinâmica assume seu grau de dificuldade na equivalência da política conforme atesta Benjamin:
A ideia central também se inspira nos clássicos. Sociedade de classes necessitam de instituições políticas muito complexas, porque nelas é preciso gerenciar um poder exercido sobre os homens. A dominação de alguns sobre as maiorias exige grandes aparatos burocráticos, político-militares e ideológicos. Nesses sociedades, em última análise e política seria a gerência desses aparatos e dessas relações de poder. Daí a necessidade de um Estado (BENJAMIN, 2003, p.143-144).
Diante de um Estado conservador e com tendências a contemplar a necessidade das classes superiores a alternativa de esquerda, coletiva e organizada serve justamente como contraponto e proposição, uma vez que, sua vocação é defender as classes subalternas e trabalhadoras. Os ideais que envolvem ambas são antagônicos, pois se de um lado visa-se a manutenção do poder e privilégios de outro se busca a conquista de direitos e afirmação de valores básicos como vida, saúde, educação, cultura, etc.
Referências:
BENJAMIN, César. Marx e o socialismo. São Paulo: Expressão Popular, 2003.
SADER, Emir. Poder, cadê poder? São Paulo: Boitempo, 2003.
VÁZQUEZ, Adolfo Sanchez. Filosofia da práxis. Buenos Aires: Consejo Latinoamericano de Ciencias Sociales. São Paulo: Expressão Popular, 2007.
*Filósofo
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