sábado, 1 de maio de 2021

A sucessão de erros do governo no combate à Covid

Por Sylvio Costa Junior


Políticas de saúde para combate à pandemia deveriam basear-se em estratégias intersetoriais articuladas com o conjunto da sociedade civil e envolvendo as três esferas de governo. Assim, caberia ao Ministério da Saúde o papel de ora arquiteto de um grande plano nacional ora de provedor de condições objetivas de combate, como insumos, compras internacionais, recursos humanos etc.  

Como diz o dito popular, “quando algo começa errado, tem grande chance de terminar errado” ou, como diria o Barão de Itararé, “de onde menos se espera, dali mesmo não sairá nada”. Temos de um lado um governo federal com ministros de Estado divididos em dois grupos específicos: os incapazes (Ernesto Araújo, Damares, Pazuello/Queiroga e Milton Ribeiro) e os capazes de quaisquer coisas (Ricardo Sales, Sergio Camargo e Paulo Guedes, por exemplo). Do outro lado, setores pedindo lockdown já.



Vamos analisar alguns pontos:

1 - O Brasil ainda não experimentou um verdadeiro lockdown, exceção feita a um ou outro município – como Araraquara/SP, administrado pelo competente prefeito Edinho, do PT (a imprensa coorporativa esconde a filiação do prefeito, mas nós aqui não!). Repetindo, do PT. A medida conhecida como lockdown foi realizada em alguns poucos países, como Inglaterra, partes da China (em particular em megacidades, como Wuhan –  que tem mais de 11 milhões de habitantes), Austrália e Nova Zelândia, entre outros. Lockdown é um forte fechamento do território com proibição expressa de circulação de pessoas. Isso ainda não ocorreu aqui.

2 - Lockdown é um remédio amargo, muito amargo, que é dado em conjunto com outas políticas sociais e econômicas. Não podemos falar para a classe trabalhadora em lockdown de forma unilateral: “Fique em casa trancado com um balde de álcool gel e espere a pandemia passar”. Lockdown envolve um robusto apoio financeiro aos segmentos mais fragilizados do nosso tecido social. Envolve custear parte da perda do pequeno comercio com financiamento e garantir segurança alimentar às populações mais frágeis. Resumindo: é uma ação cara que engloba outras tantas, somadas à vacinação em massa e em grande velocidade.    

3 - A classe trabalhadora espremida em ônibus, metrôs e trens das grandes cidades está entregue à própria sorte, vendo sua renda e emprego desaparecerem. O “Fique em casa” é factível para parte da classe média, mas isto é real para o grosso da população? O povo pode ficar em casa? Os governos direitistas e genocidas, como o do estado de São Paulo, optaram pela ação de menor custo. Primeiro foi o “Fique em casa”, agora é o “Use máscara”.  No entanto, o governo não transferiu renda para os mais pobres, não financiou o pequeno comerciante, não tem vacinação em massa. Não tem nada, apenas o “Fique em casa” e o “Use máscara””. Ou seja, gastaram muito pouco e colocaram nas costas da população a responsabilidade de combater a pandemia. O governo do Estado de São Paulo, chamado por algumas pessoas completamente desorientadas de “científico” e “amigo da ciência”, em plena crise sanitária suspendeu a gratuidade para idosos de 60 a 65 anos no transporte público. O ônibus continua rodando normalmente e lotado, mas a gratuidade para quem mais precisa acabou. Entenderam? O governo paulista reproduz a política do governo federal, mas de terno bem cortado e gumex no cabelo.

4 - Durante a crise, a indústria não parou, o transporte público. também não. Já os mais pobres eram empurrados para a covidário das estações da Luz ou da Sé, na capital paulista, ou ainda da Central do Brasil, no Rio de Janeiro.  Porém como a Covid19 é uma doença respiratória e de fácil transmissão, chegou no andar de cima de nossa desumana pirâmide social. Começaram as mortes por Covid entre famosos e endinheirados. Pra isso a direita científica, amiga da ciência, teve uma solução: fazer compras de vacinas pelo setor privado! Ou seja, ao invés de fortalecer uma vacinação com fila única pelo SUS, criaram uma outra porta de entrada, sem qualquer critério que não seja a renda. Para isso, os partidos tradicionais da burguesia (o PSDB de Dória/Eduardo Leite/Fernando Henrique e o DEM de Mandetta/ACM Neto) aprovaram, no início de abril, no Congresso essa loucura – justamente no momento em que a disponibilidade de vacinas no mundo é escassa. Quero dizer: como não há no momento quantidades grandes quantidades de imunizantes disponíveis no mundo, o setor privado não complementará a vacinação do SUS, mas vai concorrer com o SUS na compra de vacinas no mercado global de produção de insumos. No mundo real, as coisas são assim.

Por suas características de transmissão, a Covid-19 atingiu o mundo e em particular o Brasil, nas cidades mais industrializadas e com grandes contingentes populacionais. Diferente do ebola ou da malária, que acometem mais fortemente populações rurais e distantes dos grandes centros urbanos, o novo coronavírus tem maior prevalência em centros industriais das economias capitalistas. Foi assim na Itália, região de Bergamo/Milão como epicentro; na Espanha; em Madri e Barcelona; Inglaterra; EUA e Brasil.

Quero assim apontar que o governo Bolsonaro é responsável pela tragédia brasileira, mas não o único. A direita tradicional reproduz a mesma política genocida de saúde, mantem tudo aberto, não ajuda os mais frágeis, empurra a classe trabalhadora para morrer no transporte público e combate ao vírus com discurso o vazio do “Fique em casa”, do “Use máscara” ou, pior ainda: “se a doença está sem controle é porque o povo não se cuida”. 

O primeiro de maio, desigualdades e a luta das trabalhadoras e trabalhadores

Por Edson Diniz*

Em mais um primeiro de maio, talvez o mais difícil dos últimos anos, cabe nos perguntar novamente se essa data deve ser comemorada ou não. O que os trabalhadores do mundo, em especial as brasileiras e brasileiros, teriam para celebrar diante do que vivem hoje?


Para responder a essa pergunta é preciso, em primeiro lugar, olhar para as transformações pelas quais passou o mundo do trabalho nos últimos anos. Em seguida, precisamos discutir como tais transformações afetaram a vida daquelas e daqueles que verdadeiramente produzem a riqueza do país com seu trabalho diário.

Isso mesmo, são as trabalhadoras e trabalhadores que produzem as riquezas!  É preciso lembrarmos desse fato sobretudo no Dia do Trabalho, pois, apesar de produzirem toda a riqueza do país, as trabalhadoras e trabalhadoras não se apropriam dela. Pelo contrário, são aqueles que exploram o seu trabalho, os donos do capital, que acabam por concentrar em suas mãos a riqueza produzida. Tal fato só aumenta as desigualdades entre capital e trabalho e condena milhões de pessoas a uma vida de dificuldades.

Vejamos: durante a atual crise provocada pela pandemia da COVID-19, houve um aumento da riqueza acumulada pelos bilionários no mundo e no Brasil. Segundo pesquisa realizada pelo Banco Suíço UBS, o aumento da riqueza dos bilionários em 2020 ultrapassou os US$ 10 trilhões. E todo esse montante foi apropriado por apenas 2.189 pessoas,. Se levarmos em consideração que o mundo possui 7,8 bilhões de pessoas, podemos ver claramente o nível de concentração de renda que esses dados denunciam.

 Na outra ponta, a pobreza aumentou em todos os países de forma alarmante. Dados do Banco Mundial estimam que neste ano, chegaremos a 150 milhões de pessoas vivendo abaixo da linha da pobreza, ou seja, vivendo com menos de US$ 1,9 por dia,. Só no Brasil, temos 13 milhões de pessoas nessa situação. É só andar pelas ruas das cidades brasileiras para ver os efeitos concretos desse aumento das desigualdades. Na cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, a cada dia aumenta o número de trabalhadoras e trabalhadores sem emprego obrigadas/os a morar nas ruas com suas famílias. O Censo da população em situação de rua realizado em 2020 pela prefeitura carioca, aponta um total de 7.272 pessoas em situação de rua, o que pode ter aumentado com o agravamento da pandemia1. A estimativa do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) é, pGFeRa PNC sS, por exemplo, fala em pelo menos 222 mil pessoas em situação de rua no país. A maioria dessas pessoas  negra, pobre moradora de periferias e favelas e que, para sobreviver, passa a morar nas ruas do Centro e de bairros nobres para conseguir alguma forma de sustento. A fome, o desemprego e a falta de moradia, portanto, têm um corte racial.

Porém, esse quadro sombrio para as trabalhadoras e trabalhadores não se deve apenas à pandemia. Esta, agravada pela omissão e atitude irresponsável do governo federal, apenas escancarou as desigualdades e injustiças históricas contra aqueles que produzem a riqueza do país.

Na verdade, há um projeto de “modernização” em curso que, entre outras ações, atacou os direitos das trabalhadoras e trabalhadores e os substituiu pela insegurança e precariedade. Começando pelas “novas leis trabalhistas” que retiraram direitos históricos e que, somadas à “reforma da previdência”, deixaram a classe trabalhadora ainda mais desamparada.   

Esse projeto, defendido pelas elites econômicas como a salvação econômica do Brasil, obedece aos preceitos do neoliberalismo. Este, por sua vez, com sua lógica da concorrência de mercado transportada para todos os espaços da vida, recomenda a destruição do Estado de bem-estar social, a retirada de toda rede de proteção ao trabalho e o completo domínio do capital sobre o trabalho vivo. Nesse modelo de funcionamento social, econômico e cultural, o que vale é o lucro e as pessoas são apenas meios de se aumentar a acumulação de capital. 

Um dos resultados da política neoliberal é o processo de “uberização do trabalho”: As pessoas trabalham cada vez mais, recebem cada vez menos e não controlam mais suas vidas; tudo está a serviço do lucro das grandes empresas. E mesmo aqueles que trabalham a partir das demandas de um “app”, e que, portanto, têm em seu cotidiano a sensação de maior autonomia por não ter a figura de um “chefe”, se enganam. Essas trabalhadoras e trabalhadores são totalmente dependentes do poder de um aplicativo sobre o qual não têm qualquer controle. Essas pessoas não têm direitos trabalhistas, pois nem são reconhecidas como empregadas das companhias que estão por trás dos serviços que prestam, para onde vai o lucro principal. Tal situação só é possível porque temos no Brasil de hoje 14 milhões de desempregados e mais de 40% de nossa população no trabalho informal. 

Ainda temos os “terceirizados”, cujo trabalho é explorado ao extremo por organizações que prestam serviços a outras organizações que, por sua vez, cometem todo tipo de abusos contra as trabalhadoras e trabalhadores. Um caso recorrente é o das chamadas O.S. (Organizações Sociais) na área da saúde, no Rio de Janeiro, que oferecem salários baixíssimos, atrasam os pagamentos, e que, em muitos casos simplesmente desaparecem sem pagar seus empregados.

A saída oferecida pelo ideário neoliberal? Seja um empreendedor! Conceito que virou moda entre a classe média – outra vítima da crise – que realmente acredita que a solução dos problemas do mundo do trabalho passa apenas pelo “esforço individual”. Mas como imaginar alguém que vive com menos de R$ 10,00 por dia ter condições de virar um empreendedor? A solução para a precarização do trabalho, obviamente, não pode ser individual, mas sim coletiva. 

Diante desse quadro, e para não perdermos a esperança, precisamos manter e aprofundar a luta por direitos e trabalho digno. Para tanto, devemos fazer uma crítica à sociedade capitalista, reconstruir a união dos trabalhadores em torno de programas políticos de classe, e caminhar juntos a partir da ideia do “Comum”:. Ideia baseada no reconhecimento de que a humanidade só tem futuro se for capaz de superar as marcas do capitalismo e construir outra sociedade firmada na solidariedade, cooperação e humanização do trabalho

Por fim – e  embora isso não seja uma novidade, pois um velho pensador alemão já o dizia há mais de 170 anos – sempre é bom reafirmar: “trabalhadores de todo o mundo, uni-vos”! 1 3 4 5 6 DSEsSESPH FDH


Referências:

https://g1.globo.com/economia/noticia/2020/10/07/riqueza-dos-bilionarios-cresce-durante-a-pandemia-e-atinge-marca-recorde-de-us-102-trilhoes.ghtml   (Acessado em 27/04/21)

2 https://www.bbc.com/portuguese/internacional-54470607. (acessado em 27/04021)

https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/12/31/censo-mostra-que-rio-tem-mais-de-7-mil-pessoas-em-situacao-de-rua.ghtml. (acessado em 27/04/21)

https://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&id=35811 (acessado em 27/04/21)

DARDOT, Pierre; LAVAL. Christian. Comum: ensaio sobre a revolução no século XXI. São Paulo: Boitempo,2017.

MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. O manifesto do Partido Comunista. Porto Alegre: L&P,2006.


Sobre o autor:

*Edson Diniz, 50 anos, morou na Favela da Maré por 40 anos, historiador, outor em ociologia da ducação pela PUC-Rio. Cofundador da Redes de Desenvolvimento da Maré, criador do Núcleo de Memória e Identidade dos Moradores da Maré (NUMIM). Desenvolve pesquisas nas áreas de sociologia da educação, segurança pública, história das favelas e direitos humanos.


Termos para Glossário: Capital, donos do capital, direitos históricos, Reforma da Previdência, Neoliberalismo, Estado de bem-estar social, domínio do Capital sobre o trabalho vivo, trabalho vivo, app, trabalho informal, terceirizados, ideário, sociedade capitalista

A Reforma Trabalhista é um crime cometido pelo neoliberalismo

Wadih Damous

A "Reforma Trabalhista", com as inúmeras alterações na legislação reguladora do trabalho e sua contratação subordinada, já está entre nós há tempos. A Lei 13.467/17, contendo mais de cem "novidades" nas regras celetistas, foi promulgada em julho de 2017 e passou a viger em 10 de novembro de 2017. E desde então, a redução, a supressão e a modificação de direitos promovidos agravaram, enormemente, a situação já precária da classe trabalhadora e de suas entidades representativas - o que se sobrelevou ainda mais com a pandemia da covid-19.


Propagandeada como a solução para os vários males que se abatiam sobre o país de então, notadamente como forma de combater a crise econômica e incrementar os níveis de empregabilidade, o certo é que as promessas não se cumpriram. Houve demonstrações evidentes de que, se o desemprego e a estagnação econômica já galopavam antes e durante os debates sobre as reformas, assim prosseguiram mesmo depois de aprovadas. 

A prevalência do negociado sobre o legislado, a possibilidade de rescisão contratual por mútuo consentimento, a negociação direta sobre as férias, a instituição de banco de horas por acordo individual, o trabalho intermitente, as obrigações processuais impostas ao reclamante, antes gratuitas - a liquidação prévia dos valores postulados e o pagamento de honorários, entre as mais preocupantes - em nada contribuíram para "modernizar" as relações de trabalho e, facilitada a dispensa pela individualização do relacionamento e consequente afastamento das entidades sindicais das pactuações - um capítulo à parte na malsinada Reforma -, somente deterioraram o quadro de desemprego. Isso deixou ao desamparo milhões de trabalhadoras e trabalhadores, corroendo as atividades econômicas do país. 

Atividades econômicas que, curiosamente e para pôr uma pá de cal nas mentiras que embalaram a Reforma, iam de vento em popa ao tempo em que as políticas públicas investiram no pleno emprego, sob os auspícios da antiga e eficaz CLT, desfigurada a partir de 2016.

Se a esquerda for vitoriosa nas eleições de 2022, deverá organizar e propor um referendo revogatório dessa e de outras “reformas” que só retiraram direitos, como a da Previdência.


*Advogado trabalhista. Foi presidente da OAB no Rio de Janeiro por dois mandatos, presidiu a Comissão da Verdade do Rio e a Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal da OAB. 

sexta-feira, 30 de abril de 2021

A HISTÓRIA DO 1° DE MAIO

Ernesto Germano Parés

 

O século XIX marcou a grande arrancada do Sistema Capitalista e o grau de exploração sobre os trabalhadores atingia uma violência inigualável. A “Revolução Industrial”, o surgimento das primeiras máquinas e o aparecimento das fábricas levavam milhões de seres humanos a uma situação de extrema submissão ao Capital.

 

Era comum o trabalho de crianças, mulheres grávidas e trabalhadores em jornadas que duravam até 18 horas diárias, sem interrupção!

 


Os primeiros movimentos pela redução da jornada de trabalho começaram na Inglaterra, ainda na década de 1820, e foram se espalhando pela Europa. Posteriormente chegaram aos EUA e Austrália.

 Em 1886, em Chicago, os operários estadunidenses, que já haviam acumulado experiência com várias mobilizações pela redução da jornada para 8 horas diárias, resolveram que estava na hora de começar as grandes ações. Em 1° de maio de 1886 teve início a Greve Geral que contou com a adesão de mais de um milhão de trabalhadores em todo o território estadunidense. Pensem nisto: um milhão de trabalhadores parados, em pleno século XIX!

Isso incomodou muito o sistema e os patrões resolveram usar todos os artifícios para impedir que a Greve se ampliasse ainda mais. A repressão, já no primeiro dia, foi violenta e não poupou ninguém. Centenas de trabalhadores foram espancados e presos, mas o movimento ganhava mais força. No dia dois, uma grande passeata tomou conta das ruas de Chicago e os trabalhadores carregavam cartazes e faixas reivindicando a jornada de 8 horas.

A polícia não dormiu. A repressão se tornou ainda mais violenta e, no dia quatro, quando estava marcada uma grande assembleia na Praça Hay Market, uma bomba explodiu no meio da multidão matando dezenas de trabalhadores e ferindo mais de 200 pessoas, inclusive alguns policiais. 

Oito líderes do movimento foram presos, acusados de terem provocado o tumulto, e julgados: Alberto Parson, tipógrafo (39 anos); August Spies, tipógrafo (32 anos); Adolf Fischer, tipógrafo (31 anos); George Engels, tipógrafo (51 anos); Ludwig Lingg, carpinteiro (23 anos); Michael Schwab, encadernador (34 anos); Samuel Fielden, operário têxtil (39 anos); e Oscar Neeb, funileiro (35). Os quatro primeiros foram condenados à morte e enforcados no dia 11 de novembro de 1887. Os demais foram condenados à prisão perpétua. Ludwig Lingg suicidou-se na cadeia.

A luta dos trabalhadores estadunidenses, no entanto, não parou aí. Centenas de outros movimentos ocorreram e, em 1890, o Congresso dos EUA votou a lei que estabelecia a jornada de 8 horas diárias.

Em 1893, a Justiça dos EUA reabriu o processo contra os oito operários e ficou comprovado que todas as provas apresentadas durante o julgamento haviam sido forjadas e que a bomba havia sido colocada pela própria polícia para incriminar os manifestantes. Foi reconhecida a inocência dos condenados e os três operários que ainda estavam na cadeia foram libertados.

Nos EUA, até hoje, não se comemora o 1° de Maio. Canadá, Austrália e EUA são os únicos países que não comemoram a data.

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As comemorações do 1° de Maio 

Em 1889, reunidos em Londres, representantes de centenas de entidades de trabalhadores aprovaram uma resolução: que em todos os países, em todas as cidades, os trabalhadores lutassem pela redução da jornada de trabalho para 8 horas diárias e que se consagrasse o 1° de maio de cada ano a esta luta (em memória do ocorrido no 1° de maio de 1886, em Chicago). Veja como foram as comemorações no Brasil: 

1894 - Em Santos, no 1° de Maio, o Centro Socialista realiza palestra e debate. Alguns autores consideram a primeira comemoração da data, no Brasil.

1900 - Em 25/09 é fundado em São José do Rio Pardo (SP) o Clube Democrático Socialista Os Filhos do Trabalho. O manifesto do Clube para o 1° de maio de1901 foi escrito pelo socialista Euclides da Cunha que dizia ser necessária “a reabilitação do proletariado, pela exata distribuição da justiça, cuja fórmula suprema consiste em dar a cada um o que cada um merece, abolindo-se os privilégios quer de nascimento, quer de fortuna, quer da força.”

1906 - O 1° de maio foi comemorado em várias cidades. Em São Paulo, o Sindicato dos Gráficos uniu-se a outros sindicatos para realizar apresentações teatrais, em vários teatros da cidade. No Rio de Janeiro houve comemoração em praça pública. Em Santos houve comemoração, mesmo com uma violenta repressão enviada pelo governo (navios de guerra ancoraram no porto para intimidar). Em Campinas, surgiu o primeiro número do jornal A Voz Operária.

1907 - O 1° de maio foi comemorado em todas as grandes cidades brasileiras e marca o início da luta pela jornada de 8 horas em nosso país.

1909 - O número 10 do jornal A Voz do Trabalhador (1° de maio de 1909) publicava, pela primeira vez no Brasil, a letra do hino A Internacional, composto por Pierre Degeyter e Eugène Pottier, em 1871, e que já virara o hino das comemorações do 1° de maio na Europa (junto com a bandeira vermelha usada pelos operários de Paris).

1929 - Em 1° de Maio é criada a Confederação Geral dos Trabalhadores que, em março do ano seguinte, promove um Congresso de Agricultores e inicia a fundação de Sindicatos Rurais.

* É a partir dos primeiros anos da década de 40 que o governo passa a assumir as comemorações do 1° de maio e a transformar o dia de luta (pela jornada de 8 horas diárias de trabalho e de outras resistências para os trabalhadores) em festas com futebol de graça, shows com artistas e bailes para desviar o sentido das comemorações. O “Dia Internacional de Luta da Classe Trabalhadora” passou a ser usado para iludir o próprio trabalhador.

1968 – Já na ditadura militar, no 1º de maio, estudantes e trabalhadores se unem para organizar o Dia do Trabalhador. O governador de São Paulo, Abreu Sodré, alimentava o sonho de suceder Costa e Silva e resolve se promover, autorizando o ato e mandando construir um palanque. Ao chegar à praça com sua comitiva, é recebido com pedradas e palavras de ordem contra a ditadura, fugindo do local. Os manifestantes queimam o palanque oficial e saem em passeata pelas ruas da capital.

1981 - A bomba do Riocentro - A comemoração do 1° de maio, organizada pelo Centro Brasil Democrático (Cebrade), seria realizada no pavilhão do Riocentro. Cerca de 20.000 pessoas já se encontravam no local e aplaudiam um show da Elba Ramalho quando todo o local foi sacudido por uma explosão. No estacionamento do pavilhão, perto da casa de força do Riocentro, uma bomba explodiu dentro de um carro Puma com dois oficiais do exército. O caso até hoje não tem explicação, e os ministros militares anunciaram na época que os militares é que teriam sido alvos de um atentado.


Um 1° de Maio marcante Quando os metalúrgicos do ABC (São Paulo) entram em greve, em abril de 1980, o movimento já tinha algo de diferente, antes mesmo de começar. O adesivo que convocava para a Assembleia era claro: "Chegou a hora! Vamos matar nossa sede." Por seu lado, o governo anunciava sua determinação de reprimir e lembrava que o sindicato já sofrera intervenção em 1979. A assembleia do dia 30 de março, um domingo, votou pela greve. O movimento começou, e todos sabiam que seria longo e difícil. Um "Comitê de Solidariedade" foi criado e contava com setores da Igreja Católica, associações de moradores e setores da esquerda. No dia 17 de abril, às 18:30 h, o Ministro assina o decreto, determinando a intervenção no Sindicato e afastando a diretoria. No dia seguinte, helicópteros do exército sobrevoavam São Bernardo, enquanto tropas da Polícia Militar, com carros "brucutus" e policiais da temida ROTA (polícia do estado de São Paulo) cercavam o sindicato. Do outro lado, o movimento ia crescendo e conquistando todo o descontentamento popular contra o regime. A Associação Brasileira de Imprensa (ABI), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), a Comissão de Justiça e Paz e centenas de outras entidades e organizações passaram a apoiar e mostrar adesão a uma greve iniciada pelos “peões” do ABC. O 1° de Maio foi comemorado em São Bernardo (eu estive lá) por lideranças de todo o país, mesmo com a sede do sindicato fechada e sob intervenção. A greve continuava!


Uma bomba no Memorial No dia 1° de maio de 1989, em Volta Redonda (Rio de Janeiro), os metalúrgicos da Companhia Siderúrgica Nacional - CSN - inauguraram o Memorial projetado por Oscar Niemeyer em homenagem aos três metalúrgicos assassinados pelo exército durante a Greve de Novembro (09/11/1988). A Central Única dos Trabalhadores (CUT) havia indicado a cidade de Volta Redonda como a sede da comemoração oficial do 1° de maio, e caravanas de trabalhadores chegavam dos estados próximos para a homenagem. A inauguração do memorial foi presenciada por cerca de 20 mil trabalhadores que lotaram a praça e as ruas próximas. Na madrugada seguinte, dia 02, por volta das três horas, Volta Redonda acordou com o barulho de uma explosão. Na praça, centenas de pessoas atraídas pelo barulho olhavam para o memorial tombado por duas bombas de alto poder explosivo!


Termos para Glossário: Sistema Capitalista, Revolução Industrial, Capital, socialista, proletariado, ditadura

A prevenção do genocídio e a colonialidade da justiça

Julio José Araujo Junior


Em 2020, a luta dos povos indígenas no Brasil ganhou repercussão nacional e internacional. O descaso do governo federal e as mobilizações em defesa da pauta socioambiental e da Amazônia realçaram a importância de concretizar a Constituição de 1988 e assegurar a demarcação dos territórios indígenas, inclusive mediante a expulsão de invasores e a proibição de práticas depredatórias, como desmatamento, mineração e garimpo.



Diante da pandemia de Covid-19, o Supremo Tribunal Federal (STF) foi provocado a garantir medidas emergenciais em favor dos povos indígenas na Arguição de Descumprimento Fundamental (ADPF) 709. Após medida cautelar concedida pelo Min. Roberto Barroso, os ministros determinaram a instalação de barreiras sanitárias nas terras indígenas e a proteção dos indígenas em isolamento voluntário ou de recente contato. A medida foi bastante aplaudida e tratada como um autêntico cumprimento do papel da Suprema Corte em defesa de minorias.

Desde então, o governo já apresentou quatro planos para efetivar as medidas, porém estes foram rejeitados, por serem considerados insatisfatórios. A recalcitrância do Poder Executivo, que não aceita a efetivação dos direitos indígenas na forma prevista na Constituição e prefere um modelo que os trate como pessoas inferiores a serem integradas à “comunhão nacional”, ainda pesa. Na prática, os indígenas ganharam, mas ainda não levaram.

Há, contudo, um outro julgamento importante que está por vir. De nada adiantará todo o esforço de mobilização e conscientização em favor dos direitos indígenas se o STF decidir pela aplicação do chamado “marco temporal” no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 1.017.365, ainda sem data. A tese em questão foi aventada isoladamente no julgamento do caso Raposa Serra do Sol e estabelece que o direito ao território indígena está condicionado à presença efetiva na área em 5 de outubro de 1988. 

O processo aborda o direito do povo Xokleng (SC) a seu território e a constitucionalidade do Parecer 01/2017, da Advocacia-Geral da União, que pretendeu estender a aplicação da tese do marco temporal para todos os casos, o que acarretou na paralisação pelo governo federal de todas as demarcações e a não continuidade de processos.

Como já afirmei em obra específica, o marco temporal não se sustenta por diversos fundamentos. Cabe aqui destacar alguns. Em primeiro lugar, ele denota uma perspectiva assimilacionista do STF acerca das trajetórias de diversos povos indígenas, que foram despojados de suas terras e não podiam estar nelas em 5 de outubro de 1988. Tratados como incapazes e submetidos a processos de expulsões e violências reais e simbólicas, muitos indígenas não podiam estar em seus territórios nessa data. Afinal, somente após a Constituição de 1988 esses grupos puderam afirmar efetivamente a sua identidade e a sua autonomia. 

Existe, em verdade, uma segurança jurídica seletiva, que está preocupada com supostos “proprietários”, naturalizando a opressão sobre os grupos étnicos. A segurança jurídica não contempla os índios, pois estes devem assistir às definições que os brancos fazem em favor da “verdade registral” das propriedades, cuja naturalização provoca o apagamento da subalternização permanente. 

O marco temporal promove, por via indireta, um controle da identidade indígena, já que pressupõe que apenas são merecedores da proteção dos direitos territoriais indígenas os grupos que estavam em suas terras em 5 de outubro de 1988. Há, é verdade, a exceção do chamado “renitente esbulho”, porém a ideia limita, na prática, a garantia de direitos territoriais a “grupos indígenas do passado”. Além disso, a limitação no tempo não esconde uma proteção privilegiada à propriedade privada, já que tem o assumido propósito de estabilizar os conflitos em favor dos atuais proprietários. 


Essa história não começou em 1988

Esta concepção está atrelada a análises estigmatizantes que favorecem a subalternização permanente dos índios, enviesando toda a análise da legislação e de princípios constitucionais. Ainda que toda essa crítica não fosse possível, pode-se dizer que o verdadeiro marco temporal residiria na Constituição de 1934, que foi a primeira a abordar os direitos dos indígenas às suas terras. Como os próprios indígenas afirmam, essa história não começou em 1988.

Negar a territorialidade indígena é um fator de risco para atrocidades massivas e até mesmo de genocídios. Afinal, sem os espaços onde podem desenvolver seus modos de vida, costumes e tradições, os povos indígenas se tornam vulneráveis a ameaças e deixam de exercer livremente sua identidade, o que afeta a sua sobrevivência física e cultural. Assim, a decisão de “não demarcar um centímetro de terra”, propalada pela Presidência da República, associada ao marco temporal, representa, por via direta ou indireta, a morte total ou parcial de um povo.

Em suma, o marco temporal é uma tese que escancara as colonialidades ainda tão presentes no sistema de justiça. Como afirma Rita Segato, em abordagem sobre o sistema penal que aqui se mostra plenamente aplicável, descolonizar a justiça implica refazer o cálculo das dívidas, com a consequente redistribuição das posições entre devedores e credores. Trata-se não apenas de uma meta democrática, mas de um dever de prevenção de genocídios.

Isso significa, em outras palavras, reconhecer que os direitos territoriais indígenas não são uma medida apenas de reconhecimento, mas também de redistribuição, em oposição à concentração fundiária e a uma cidadania de segunda classe que foi e continua sendo imposta a esses povos. É necessário pensar nos povos indígenas com os olhos para o presente e para o futuro, em atenção às suas mobilizações e reivindicações. O STF tem uma tarefa histórica a cumprir: mostrar que a descolonização da justiça passa por concretizar as terras indígenas, sem essencialismos e sem limitações inconstitucionais.


Você sabia que indígena também é cidadão brasileiro?

Cristiane Santos e Mani Ceiba

Oiê... Vamos acender o pavio de mais algumas perguntas que parecem óbvias, mas na prática não são bem assim. 

Os indígenas representam 5% da população mundial, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Os povos indígenas compõem um terço da população mais pobre do planeta e estão expostos a sérios problemas – doenças, discriminação, perseguição, racismo, baixa expectativa de vida, ameaças territoriais e pouca garantia de direitos humanos. 

No Censo Demográfico de 2010, foi verificado que a população indígena no Brasil era de 896 mil pessoas – 572 mil (ou 63,8 %) viviam na área rural e 517 mil (57,5 %) moravam em Terras Indígenas oficialmente reconhecidas.

O Censo que estava programado para 2020 foi transferido para 2021 por causa da pandemia e acaba de ser adiado mais uma vez. O montante de R$2 bilhões previsto para a pesquisa sofreu corte de R$1,76 bilhão, cerca de 90% do total. 



Caso o levantamento censitário levasse em consideração perguntas para avaliar o nível de descontentamento, raiva, falta de representatividade e indignação, os povos indígenas teriam muito o que dizer. 

No primeiro Censo realizado pelo IBGE, em 1940, e somente neste único, para saber quantos estrangeiros viviam no Brasil, foi adicionada a pergunta: Você fala português? Ela possibilitou, meio sem intenção, a descoberta de que 3,6% dos habitantes falavam algum idioma nativo, como o guarani. 

Em nenhum outro Censo houve mais informações sobre os povos indígenas. Em 2000, foi introduzida a pergunta sobre cor ou raça. Mas foi preciso esperar o Censo de 2010 para saber da existência no Brasil de 274 línguas indígenas autodeclaradas, de 896.917 indígenas e de 305 etnias. Os dados de certas áreas, quando existem, são incompletos e insuficientes. 

Barreiras no mercado de trabalho – Morar nas cidades por exemplo, sem ocultar a ancestralidade e as próprias referências, é ainda uma luta para mais de 315 mil indígenas, segundo dados do mesmo Censo de 2010. 

Em busca de melhores condições de vida, muitos indígenas e descendentes vivem em centros urbanos em situação de pobreza. Têm dificuldades de conseguir emprego e a principal fonte de renda é o artesanato. Os que buscam emprego muitas vezes não declaram ser indígenas pela dificuldade e preconceito. A visão distorcida ensinada nos livros de história –  nos quais o indígena foi substituído pela mão de obra do povo negro por ser preguiçoso, insolente, selvagem e incapaz –  perpetua-se até hoje na visão do não indígena.

Você conhece alguém que tenha repetido essa versão preconceituosa? Nós conhecemos...

Apesar de a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 7, reiterar a igualdade de direitos entre todos os trabalhadores urbanos, rurais e outros, com a proibição de diferença de salários, de exercícios de funções e de critério de admissão por motivo de sexo, idade, cor, ou estado civil, o Instituto Ethos nos alerta que a população indígena não conta com representantes indígenas nos quadros de conselho administrativo e executivo dentro das 500 maiores empresas  do Brasil.

A remuneração de trabalhadores indígenas é em média inferior a R$ 937. Ocupam funções de pedreiros, boias-frias e empregos domésticos.  

Uma outra realidade são as vagas para os jovens nos programas de “jovem aprendiz”. Eles só conseguem ocupar vagas se esconderem a sua identidade indígena; o que mais uma vez comprova o preconceito. Passam então a ser pardos, nordestinos, brasileiros, pois há uma parcela da população que acredita que indígenas não são brasileiros.

Um dos pedidos, quando se consegue o emprego, é não usar seus adornos e pinturas corporais. Parece que a representação de identidade de um povo só pode ser usada na cidade em um feriado chamado carnaval. 

Efeitos da pandemia – Segundo um estudo da Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social), utilizando os dados do IBGE, os indígenas foram os mais afetados pelos impactos da pandemia no mercado de trabalho.

“Os indígenas, de todos os grupos, são os que mais perderam. Perderam 28,6% de renda, o desemprego aumentou mais do que o dos outros grupos, a participação no mercado de trabalho caiu bem mais do que dos outros grupos, e a jornada caiu tanto quanto a de pardos, por exemplo”, afirma Marcelo Neri, diretor do FGV Social.

Um dos motivos pode ser exatamente a informalidade. E as consequências disso ainda são incertas.

Enquanto temos o aumento de 52,5% no ano de 2016 de indígenas ingressando nas universidades, entendemos que a educação é o meio principal de acesso a melhores cargos. Mas esse quadro não se repete de maneira proporcional quando falamos de mercado de trabalho.

Reescrever a história – A solução para combater a discriminação e o racismo com a população indígena é reescrever a história do Brasil, com a aplicação da Lei n 11.645/08, que inclui no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática referente à história e à cultura indígena. Os conteúdos devem ser apresentados já na Educação Básica, indo até a universidade, incorporando datas comemorativas datas comemorativas indígenas nos calendários escolares e nacional. 

Dessa forma, a visão discriminatória do indígena aos poucos desaparecerá e iremos compreender que ele faz parte da construção do Brasil, pois aqui quando os escravizados chegaram já havia uma cidade construída em cada região do país. Isso vemos no livro Índios, Guerreiros e Úteis Povoadores, escrito por Silene Orlando Ribeiro, no qual ela relata a vida dos indígenas, seus salários e colaboração na construção da cidade de Cabo Frio.   

Indígena, um ser que descerá de uma estrela colorida brilhante, pois é mais fácil um ET ter mais direitos que o próprio indígena em sua Terra Mãe.


Referências: Agência Brasil/IBGE/FUNAI/OCA-coletivodeartesãos