terça-feira, 3 de agosto de 2021

AQUI E AGORA

Ilustração Guilheme Maia


ELE NÃO!

Por Guilherme Maia e Rodrigo Cosenza

Estamos em um tempo de revelações, da exposição das mazelas arraigadas em nosso pensar e fazer coletivo. Isso em relação aos incontáveis preconceitos e práticas de violência direta e simbólica praticadas pelos arcaicos donos do poder no Brasil - a classe dominante de nosso país.

O Brasil era um país onde não havia racismo? Provou-se que não. O Brasil era de uma cordialidade indelével e que compensava desigualdades e concentração de renda? Também se demonstrou à vista de todos que isso é uma tolice que mais servia para conter a contestações e revoltas do conjunto da população frente ao grau de exploração a que é submetida.

O fato de não ter havido uma ruptura estratégica com os grupos de poder que estruturaram a ditadura militar – seja pelas condições ou possibilidades dadas à época – permitiu que, por duas décadas, o ovo da serpente fosse chocado livremente na chamada “Nova República”.

Resistência

Na História do Brasil sempre foi importante a resistência cultural – uma verdadeira trincheira – formada por artistas e intelectuais orgânicos das gerações passadas, que  combateram por meio da estética e da lírica. Criticavam e apontavam perspectivas de um convívio mais livre e justo, que superasse uma realidade de pobreza material e exploração, mas também para agitar as massas promovendo a mobilização de encontro à conjuntura extremamente desfavorável que se apresentava.

As forças progressistas e as forças reacionárias sempre disputaram como se estabeleceriam as regras e, por vezes, tivemos vislumbres de avanços, a muito custo e com a reação pronta e disposta a cobrar o preço. Exemplos foram a criação e instalação do Sistema Único de Saúde, o SUS, que teve como protagonistas os comunistas brasileiros; o Estatuto das Cidades ou o Sistema Único da Assistência Social (SUAS). Todos foram grandes avanços em nossa possibilidade de coletividade cidadã, mas sempre bombardeados com restrições orçamentárias e propagandas ideológicas de descrédito almejando sua privatização total. A luta está aí, como sempre esteve.

Somos vítimas de um projeto de domínio que passa pelo entorpecimento da consciência coletiva. E também pela manipulação da revolta que turvou o sentimento de pertencimento à uma nação em um chauvinismo culminando na ascensão de um fascista de cores auriverdes. Patriotismo de fachada, posto que o que de fato temos é o desmonte do Estado e dos bens e serviços públicos.  Vemos assim a impossibilidade de formação de identidade nacional real e aberta ou mesmo uma globalização participativa entre culturas. O que temos é o desmonte até mesmo da cultura popular em seus sentimentos mais enraizados!

Elite predatória

A classe dominante brasileira que fomenta o atual estado de coisas é predatória e impõe e usufrui de uma concentração obscena de renda e de riquezas, sempre saudosa da República Velha, talvez até da escravidão do tempo do Império. Para garantir seu poder a elite leva a cabo o projeto autoritário de agora.

A deturpação dos sentidos, como uma desenvolvida máquina de alienação em massa, alça essa desorientação ao fazer político e isso é uma produção cultural, mesmo que pelo DarkSide. É, sim, uma produção cultural, porque põe de ponta cabeça o entendimento por produções de realidades estéticas, seja da retórica, seja da diagramação de memes e quejandos. Trata-se de uma anticultura, de uma antiarte. É o pensamento de quem domina as condições materiais e políticas se fazendo hegemônico na arte, na cultura, nas diversas formas de expressão.

Por isso, a organização antifascista e democrática precisa produzir cultura e manifestar a beleza do criar artístico com as reivindicações políticas de liberdade, da diversidade e da superação da exploração. Da arte mais simplória às elaborações mais sofisticadas, é preciso apontar para a emancipação humana. Seguir e avançar no caminho de gente como Carybé, Portinari, Jorge Amado, Chico Science, Gonzaguinha, e tantos outros.

Nós aqui demos nossa pequeniníssima contribuição. Compusemos a música Ele Não para marcarmos a época em que vivemos, pois temos de produzir e participar de nosso tempo, para sermos plenos em nossa vida! 

“Vamos acordar e viver um novo dia

Nossa liberdade conquistar”

Entoa a música antes do ápice “Ele Não!”.

Já sabemos que “Ele Não”! Agora falta cantarmos, desenharmos e encenarmos isso para deixar nossa marca em nossa época ou, ainda, combater com as mesmas armas a produção de alienação de massas pela propaganda ideológica do neofascismo. A liberdade e fraternidade de uma humanidade emancipada é nossa pulsão!


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