domingo, 5 de setembro de 2021

Se precisar, peça ajuda

Por Mani Ceiba

Setembro começou e já começo ver chamadas para o Setembro Amarelo em todo canto. Acredito muito na importância da campanha, mas não é só em setembro que isso tem que ser lembrado... Mas chamar a atenção para o assunto, falar e colocar na mídia traz olhares e isso ajuda. Mas sempre parece pouco. Pessimista? Não, são dados mesmo. A taxa de suicídios a cada 100 mil habitantes aumentou 7% no Brasil, ao contrário do índice mundial, que caiu 9,8%, segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS)

O suicídio foi a segunda principal causa de morte entre jovens de 15 a 29 anos, após os acidentes de carro. 



Cerca de 800 mil pessoas acabam com suas vidas todos os anos no mundo, o que equivale a uma morte a cada 40 segundos. Você leu certo, uma pessoa se mata a cada 40 segundos. É como uma guerra!! E ela está do seu lado, trabalhando, num jantar ou até rindo e você não percebeu ou julgou ou ainda disse: - É frescura, vai lavar uma roupa! 

Para mim, esse tema é como uma demonstração, mais que isso, uma chaga, um grito, um espelho gigante que mostra muito das mazelas e hipocrisias do mundo que vivemos

Primeiro o ser humano vive como se fosse eterno. Finge todo tempo que não sabe que a única certeza da vida é a morte. Sim, todos nós vamos morrer e pode ser amanhã ou daqui a dez minutos! A ilusão da eternidade, do para sempre é tanta que olhar ou falar dela é algo perigoso. Como que se falar de morte atraísse a morte... Tenho uma coisa para dizer meus caros, estamos morrendo todo tempo... a morte nos ronda e nos permeia em tudo, inclusive na fruta fresca que acabei de comer. Essa fuga é no mínima estúpida. Olhe para isso e talvez seus valores possam ter outro significado. 

Não satisfeito em fugir da certeza da morte, foge da dor e do que lhe parece feio e não representativo da vida cor de rosa com arco-íris. Dessa forma podem nascer preconceitos, julgamentos baseados em mundos faz de conta e verdades distorcidas. Assim uma pessoa pode não olhar para uma criança passando fome, isso é feio demais, não combina com seu mundo. Ela não vê o outro sofrer a ponto dessa dor ser tão intensa que só quer resolver.

Muitos motivos podem levar uma pessoa a cometer suicídio. E entenda, ser humano, você não sabe quais são... Somente ela sabe o que está sentindo e passando! Não tem gênero, não tem raça, não tem classe social e principalmente não tem religião! É dona de casa, é músico de sucesso, é adolescente. É um doente, é um religioso, é uma pessoa que teve uma perda muito grande ou não. E essa pessoa era filha, irmã, mãe, pai, vizinho de alguém. 

Ainda de acordo com a OMS, mais de 95% dos casos de suicídio estão associados à saúde mental mas 60% nunca se consultou com um profissional de saúde mental, percebam esse detalhe! As pessoas não buscam ajuda. Motivos? Posso pensar em alguns... quantas têm acesso, sabem aonde ir? Quantas não falam o que estão passando por falta de apoio, por vergonha, medo, preconceito? Quantos falam e não são ouvidos e atendidos? Falar de suicídio envolve falar sobre saúde mental, sobre cobranças, sobre ansiedade, sobre depressão, sobre acesso à saúde, sobre economia, já que 80% dos casos ocorrem em países de baixa e média renda, como o Brasil. Mas principalmente sobre olhar e respeitar o outro e nós mesmos. Sobre curar a doença em nós que apontamos o dedo, que negamos, que fugimos, que rotulamos, que manipulamos... e tem os que usam uma depressão ou outra patologia, por exemplo, como justificativa para falta de caráter também. 

A sociedade é doente. E a sociedade é feita de pessoas. Eu, você e seu vizinho. Das prioridades e valores que cada um carrega. Da mesma forma que nossa saúde está em perigo pelos agrotóxicos que comemos, nossa saúde mental também está em colapso por todas as mentiras e pequenos venenos que produzimos todos os dias nas relações da vida. Não estou dizendo que é a sociedade que cria um suicida, mas que contribui e ainda pode alimentá-lo já é difícil de não dizer.

Todos nós sabemos de casos de pessoas que pareciam estar bem, rindo em um dia e se matam no outro. Além de todos os fatores possíveis envolvidos nisso, não podemos negar que nós aprendemos a esconder o que sentimos muito cedo. Faz parte do desenvolvimento da autopreservação esconder o que sentimos diante do mundo. Há pessoas que precisam esconder tanto que sabem fingir outro sentimento. E isso foi evoluindo tanto que escondemos de nós mesmos. Por que precisamos esconder? Por que ser nós mesmos é tão sofrido? Por que tanto medo?

Existe também a mídia sensacionalista, que aborda o tema suicídio como um espetáculo, se for de um famoso então... uau... Gatilhos, métodos, manchetes escrotas dançam em imagens grotescas que só me fazem pensar mais na sociedade doente. Quem consome e quem ganha com isso? A morte e a dor sempre escondida, nesse contexto vira celebridade.

Estamos falando de pessoas. Como eu e você, aliás poderia ser eu ou você! Poderia ser sua mãe! Por isso campanhas como o Setembro Amarelo têm seu valor. Vamos falar sobre. Vamos ouvir sobre. Pensar sobre. Esconder não tem ajudado. Aliás esse é o recado desde a criação da campanha de combate ao suicídio. A origem do Setembro Amarelo, e todo esse movimento de conscientização contra suicídio começou com a história de Mike Emme, nos Estados Unidos. O jovem era conhecido por sua personalidade carinhosa e habilidade mecânica, tendo como sua marca um Mustang 68 que ele mesmo restaurou e pintou de amarelo. Em 1994, Mike cometeu suicídio, com apenas 17 anos. Nem a família, nem os amigos de Mike perceberam o que ele estava passando. No funeral, os amigos montaram uma cesta de fitas amarelas com a mensagem: “Se precisar, peça ajuda”. 

Em 2003, a Organização Mundial da Saúde (OMS) instituiu o dia 10 de setembro para ser o Dia Mundial da Prevenção do Suicídio. O amarelo do Mustang de Mike é a cor escolhida para representar essa campanha.

Algumas dicas como: não diga é mimimi, coisa do diabo, comentários muito desagradáveis e preconceituosos em redes sociais, vai passar ou é só levantar e beber água com limão, é o mínimo que se espera de seres humanos com noção, mas o recado mais importante é para quem está sentindo...

Procure ajuda! Ninguém tem que passar por nada sozinho e sem apoio.

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