Por Mario Lucio Machado Melo Junior
Esse assunto é tão complexo e profundo, envolto em nebulosos preconceitos que, só ao falar as palavras “REFORMA” e “AGRÁRIA”, as pessoas viram a página ou ensurdecem, certamente achando que já sabem tudo, pois sua formação ideológica já tem um rótulo para isso, levando a um ledo engano.
A proposta de reforma agrária, resumidamente, surgiu na Europa, no período de transição entre o feudalismo monárquico e o republicanismo burguês, da luta direta entre os senhores feudais e seus vassalos pela posse do meio de produção de alimentos, vulgarmente chamada de TERRA. Sabemos o resultado dessa disputa: os senhores feudais perderam seu domínio político, econômico e social e os governos republicanos da Europa, agora nas mãos da burguesia comercial e industrial promoveram, entre outras ações, a reforma agrária em seus territórios, que provocou uma revolução tecnológica, industrial, trazendo riqueza, conforto, saúde e educação, principalmente para as populações urbanas, mas indiretamente e em menor grau para as rurais.
Em muitas das colônias europeias, isso também ocorreu, como nos Estados Unidos da América, Austrália e Nova Zelândia, que promoveram a ocupação de seus territórios, buscando aumentar sua base de produção de alimentos, criando um mercado consumidor de produtos industrializados, obviamente alcançando um rápido processo de desenvolvimento econômico e social. No Brasil, como é fácil de observar, nem a ocupação do campo e a distribuição das terras ocorreu dessa forma. Hoje, a “burguesia” brasileira diz que reforma agrária é sinônimo de socialismo = comunismo, como se a propriedade individual da terra fosse uma coletivização da apropriação do meio de produção. Esses, precisam estudar melhor o que é o capitalismo.
Já os “socialistas” afirmam que é um processo social revolucionário, como se no comunismo a propriedade das terras não fosse coletiva, do Estado, e só o trabalho individual. Esses precisam estudar melhor o que é o socialismo. Em resumo, esses argumentos, da maneira como são apresentados, revelam generalizações “ideologizadas” (no mundo do imaginário), totalmente desprovidos de fundamentação lógica real.
No Brasil
Aqui no Brasil a luta pela reforma agrária foi capitaneada pelos trabalhadores rurais superexplorados pelos latifundiários, organizados em seus sindicatos; pelos filhos de pequenos produtores rurais em seus minifúndios, principalmente no sul do país, procurando novas fronteiras agrícolas; pelas militância das pastorais de igrejas cristãs em todo o país, buscando uma solução idílica e utópica; e por pessoas pobres, miseráveis, excluídas de todas as oportunidades de acesso a qualquer meio de produção, fora da pirâmide econômica. Ponha-se no lugar dessas pessoas olhando para todos os latifúndios improdutivos do país e o mar de terras devolutas da União, sem nenhum uso produtivo e eles, habituados a produzir para outros, sem nenhuma oportunidade de entrar, pacificamente, nesse processo.
Do outro lado está a elite agrária do país, formada por pessoas herdeiras de grandes latifúndios originários do processo de colonização e sustentáculos dos nobres escravocratas do império, bem como de novos grileiros de terras devolutas da União, visando à ocupação de vastas áreas com gado criado extensivamente ou à produção vegetal em larga escala, de produtos voltados para a exportação.
Está aí formada a equação matemática para: a) prosperidade, distribuição de riquezas, fortalecimento social da nação, dignidade cidadã, segurança alimentar; ou b) pobreza, exclusão econômica, concentração de renda, conflitos sangrentos, entre outros.
A reforma agrária é um fato concreto, deve fazer parte de um projeto político nacional para o seu desenvolvimento, deve ser uma decisão tomada conscientemente pela sociedade, com prazos, metas e propósitos definidos. Os resultados devem ser avaliados e as políticas públicas de investimento na infraestrutura e demais meios de apoio devem ocorrer simultaneamente, sem atrasos e descompassos.
Os ideólogos podem disputar as mobilizações pró ou contra as propostas que acharem corretas e justas, aliás como sempre foi feito na história da humanidade, porém reduzir o destino de uma grande parcela da população brasileira a um cabo de guerra, num jogo de palavras desprovido de sentido fático, ultrapassa os limites do razoável, sensato e aceitável. Por tais motivos, estou absolutamente convencido da importância e urgência de uma reforma agrária para o rápido desenvolvimento econômico, social e político do país, o que certamente possibilitará um aumento de nossas consciências e experiências para alcançarmos formas e estágios de organização superiores, mais condizentes com nossa existência humana.
Agricultura familiar
Muito bem, se o que já foi apresentado não é suficiente para você entender a importância da reforma agrária, aqui vai o último e mais importante argumento. A agricultura altamente tecnificada, mecanizada, consumidora de insumos importados controlados pelas multinacionais, voltada para a exportação bruta de comodities, que não são consumidas aqui no Brasil, promove riquezas para uma pequena elite que domina o poder político no congresso nacional com a famosa bancada ruralista.
Já a agricultura familiar é alicerçada no trabalho familiar, com máquinas de pequeno porte, respeitando o meio ambiente, consumindo insumos produzidos em pequena escala de resíduos de outros processos produtivos e integrados da própria propriedade, empregando milhares de pessoas em suas cadeias produtivas e consumidoras. O mais importante é que gera mais de 70% de todos os alimentos consumidos na mesa da população, distribuindo renda e promovendo a segurança alimentar. Sabe o que é o dínamo alimentador da agricultura familiar? A Reforma Agrária!!!
Nos próximos artigos vamos discutir as formas de produção agrícola existentes e como elas impactam o meio ambiente e a saúde de toda a sociedade. Como promover a segurança alimentar da população e o acesso de todos, a preços justos.
Sem comentários:
Enviar um comentário